quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

O Sentido Oculto das Coisas

Por detrás de tudo existe uma intenção. Não importa se a moça é jovem, meiga e possui um rosto angelical, por detrás de sua existência há interesses. Quando alguém lhe sorri, é por interesse; quando alguém lhe estende a mão, é por interesse; quando alguém lhe olha, é por interesse. Não existe acaso, não existe sorte, não existe coincidência – a raça humana é maquiavélica.
Quando o seu vizinho, aquele senhor de 70 anos, aposentado, que vive varrendo a calçada, chega e lhe diz “como vai o trabalho?” ou “vai viajar no final de semana?”, ele faz isso não apenas com a intenção de ser agradável, mas também com a intenção de lhe conhecer melhor, de saber quem você é. Quando o mendigo da rua, aquele que vive com um copo de cachaça e uma viola na mão, chega e começa a contar histórias divertidas, ele não faz isso “só por fazer”, no lance seguinte, quando você já estiver maleável, achando que o mundo é um lugar bom e tal, ele vai lhe pedir dinheiro. Não há saída: sobrevive o mais rápido.
É claro que também existem intenções verdadeiras – o amor, a amizade, a família, são exemplos – mas o que impera, no fundo, é o sentido oculto das coisas. Como costumavam revelar as histórias de Nelson Rodrigues: “Não teve pressa. Durante 48 horas, debateu-se em dúvidas medonhas. Trair era ou devia ser facílimo; restava, porém, a pergunta: ‘Com quem?’ Passou em revista todos os amigos e conhecidos. Ia excluindo um por um, através de um processo eliminatório. Acabou se fixando num tal de Mascarenhas, casado, e colega do marido. Telefonou-lhe, sem dizer quem era. E o outro, ouvindo uma voz feminina, inflamou-se. Queria um encontro imediato, numa lugar assim, assim” (p.233).

[RODRIGUES, Nelson. A vida como ela é... Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2012]

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