sábado, 27 de abril de 2013

Penso logo Existo?


Nem todo mundo pensa. Parece brincadeira, mas é verdade. Algumas pessoas, por hábito ou cultura, se acostumaram a viver sem refletir, simplesmente fazendo o que todo mundo faz, simplesmente reproduzindo o que se aceita como ‘normal’.
Entretanto, existe um outro grupo de pessoas (uma minoria) que, atuando ou não, utiliza-se do pensamento para interpretar os fatos. O pensamento crítico, o pensamento fantástico e o pensamento associativo são subdivisões deste ponto de vista. O primeiro questiona, indaga, desconfia. Busca o fundamento das coisas, é filosófico, é racional, é contrário, é rebelde, não aceita a normalidade. O segundo é a própria imaginação, é a loucura, é o surrealismo, é uma ponte no espaço, uma árvore no deserto, é o impossível sendo criado, enfim, não é a imitação, é o diferente, nunca o igual. O pensamento associativo, por sua vez, possui a incrível capacidade de relacionar uma coisa à outra – a Física à História, o econômico ao político, a sociedade à Igreja, a paixão ao terrorismo – mundos teoricamente separados, mas, que na prática, coexistem.
A música Brigitte Bardot, do disco O Pirulito da Ciência (2009), gravadora Biscoito Fino, é uma obra-de-arte que reúne em si as três formas de pensamento aqui expostas. Nesta canção, Tom Zé analisa o serumano atual.



quinta-feira, 18 de abril de 2013

Crítica ao Facebook


Tenho um perfil no Facebook há quatro meses. Pensei muito antes de criá-lo, não gosto de pertencer às "tendências", por isso evitei até o último momento. Entretanto, em função da necessidade de "fazer parte das coisas", aderi ao esquema.
Pra minha surpresa acabei descobrindo que o pior não é o Facebook em si, mas o uso que os facebooquianos fazem dele. De um modo geral as pessoas procuram se tornar populares a qualquer custo e como a internet é um ambiente rápido e de entretenimento (em oposição à reflexão), publicar uma foto é mais midiático do que publicar uma ideia. O problema é que tem gente que leva isto às últimas consequências.
Nestes poucos meses, vi de tudo. Sem querer pessoalizar a crítica, vi pessoas – belas mulheres e belos rapazes – que se vestiam com boas roupas e iam a festas, e que, no outro dia, postavam fotos com dizeres “eu e fulano de tal em Hollywood”, como se fossem verdadeiras estrelas. Vi pessoas, aparentemente normais, que depois de comprarem um carro ou uma moto, ou mesmo pessoas que fizeram viagens de turismo a lugares badalados, que, em função de terem conquistado este prazer, de terem atingido este status, se sentiram superiores ou melhores (ou sei lá como) e, por necessidade de aparecer ou por modismo mesmo, publicaram fotos com os dizeres “eu e o meu automóvel” ou “eu em minhas férias inesquecíveis”. Vi pessoas que, na ânsia de se tornarem notícia, publicaram fotos repetidas, onde apareciam fazendo uma careta ou algo bizarro. Vi, também, (acreditem!), um senhor que celebrou o funeral de seu cachorro de estimação publicando fotos do pobre coitado, como se ele fosse gente. Nunca imaginei que a criatividade humana pudesse ser tão mal usada!
"Os homens nascem, comem e morrem, mas só a história pode informar-nos sobre as suas guerras e seus impérios; eles são cruéis e banais, nem totalmente bons, nem totalmente maus; mas a história nos dirá se, numa determinada época, preferiram ter maior lucro por um tempo mais dilatado a se aposentarem depois de terem feito fortuna, e como percebiam e classificavam as cores" (Paul Veyne, In: Como se Escreve a História. Brasília, 1998, Editora: UnB, pág. 19). 

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Vida Alternativa

Ele não usa computador, mas já ultrapassou 900 fãs no Facebook. Não tem telefone, mas se comunica muito bem. Não cumpre horários, mas andou tentando vender um relógio dia desses. Acha ‘pouco’ se candidatar a vereador, mas desconhece a Dilma. Não tem um tostão furado, mas gosta de escolher marcas de chocolate e de roupa, como botas Timberland, calças Ellus de couro e uns casacos de nobuck com pele para enfrentar o inverno que vem aí. Fala de ‘probleminhas’ com a polícia, mas brigadianos descem de um carro só para cumprimenta-lo. Deixou a escola há anos, mas sabe palavras em inglês e, a seu modo, se mantém conectado com o que acontece no mundo, como o meteoro que caiu na Rússia. Tem dúvidas se Deus criou o universo, mas traz o nome de Jesus.
Tantas contradições carrega um popular morador de rua da Bela Vista, um dos bairros mais nobres de Porto Alegre – o Jesus da Nilo, referência à mais importante avenida da região. Mas por que, entre 11 mil habitantes, em um bairro marcado por revendas de carro luxuosas, sofisticadas casas de móveis, condomínios residenciais e prédios de escritório de alto padrão, cujo crescimento foi puxado pelo Iguatemi a 30 anos, fui conversar logo com ele?
Porque as histórias que a anos rodam no bairro mereciam explicação. Porque Porto Alegre merecia conhecer a simpatia e a popularidade de Jesus, este homem mirado, magro, com poucos dentes na boca e olhos claros, que não para de conversar e sorrir para quem passa pelas imediações da Nilo Peçanha com a João Walling.
Jesus, hoje às vésperas de completar 47 anos, foi muito maltratado pela vida, mas não aparenta raiva alguma dela. Contam que ele morou no Menino Deus ao lado de duas irmãs e um irmão, e que teria sido aluno do Anchieta e cursado Medicina – o que Jorge Luiz (seu nome verdadeiro; o sobrenome ele não revela) nega. Certo é que um maremoto familiar provocou a brusca guinada.
Foi em fevereiro de 1992, quando morreu, ao lado dele, sua mãe, Maria Joana – o pai, Francisco Laerte, já era falecido. No mesmo dia, o então funcionário da associação dos servidores da Caixa Econômica Federal teria sido abandonado pela mulher, que levou junto os filhos, Diogo e Renata.
- Tive família e um trabalho que amava por 10 dez anos – relembra Jesus.
- Quando tudo se concretizou, acabou de uma maneira trágica e aí fiz a opção de descer para conhecer a miséria, que me proporcionou força de viver. Poucos têm coragem não só de conhecer o céu, mas também o inferno. Nem sei se vou para o céu, não tenho certeza de minha missão. Alguém tem que salvar o mundo, mas, com certeza, não serei eu.

[Zero Hora, terça-feira, 26 de março de 2013]. 

quinta-feira, 4 de abril de 2013

À Respeito do Novo Papa

Francisco prometeu um papado para os pobres. Prometeu e com menos de um mês à frente do Vaticano já implementou mudanças – senão substanciais, pelo menos significativas – que atestam o seu caráter teórico-prático. (Diga-se de passagem, a espécie de caráter dos grandes personagens da história universal).
Ainda como bispo de Buenos Aires, Bergoglio costumava abandonar as belas dependências da arquidiocese argentina para ir de encontro aos pobres, nas vilas. Uma postura pouco comum, mesmo no meio da fé - geralmente os detentores de altos cargos preferem um ‘governo de gabinete’. A naturalidade com que se comunica o Papa também destoa. Ele ri, quebra protocolos, conta histórias, rompendo com aquela tradicional postura rígida e calculada ‘dos eleitos’.
Dizem que Bergoglio teria se assustado com o tamanho e com a suntuosidade da residência papal. “Aqui poderiam viver 300 pessoas” – e riu. Optando por morar num espaço bem menor. Também abriu mão do anel de ouro, preferindo o de prata, e do trono, preferindo a cadeira.
Assim, leitores, se constrói Francisco, com belos discursos, sim, mas principalmente, com gestos de humanidade, conforme esta na Bíblia: “Depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus vestiu o manto, sentou-se de novo e perguntou: ‘Vocês compreenderam o que eu acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre e o Senhor. E vocês tem razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei um exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior do que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso serão felizes se o puserem em prática’” (João 13: 12-17; Edição Pastoral, 2010).