sábado, 27 de dezembro de 2014

Paradoxo Natalino

O Natal, que simboliza o nascimento do menino Jesus, é a data mais importante do cristianismo e, paradoxalmente, é também a data mais importante do ano para o comércio, em função da maciça venda de presentes.
Eu usei a palavra paradoxalmente, pois, na teoria, uma coisa não se relaciona com a outra. Apesar de, no Vaticano, os talheres serem de ouro, o cristianismo, em essência, é simplicidade; as circunstâncias que envolvem o nascimento do menino Jesus são a maior prova disso: “E ela deu à luz o seu filho, o primogênito, e o enfaixou e deitou numa manjedoura, porque não havia lugar no alojamento” (LUCAS 2:7). A opulência, a índole consumista, a cerimônia com que a contemporaneidade reveste o Natal, portanto, é falsa, é inverídica, é mentirosa. O que acontece, no fundo, é uma apropriação das coisas – o capitalismo, com o intuito de vender, inventou o Papai Noel, a história da chaminé e as renas, povoando o imaginário ocidental com seus enfeites, substituindo a espiritualidade verdadeira pelo desejo de ser presenteado, a bondade pela alegorização, o gesto de amor pelo dinheiro.
Está certo que é no Natal que as famílias se reúnem, que as pessoas se abraçam, que os ânimos apaziguam, mas não está certo que os donos do poder façam do Natal a mais importante data do consumismo, que a indústria do marketing se apodere do “nome de Deus” para vender, que as criancinhas cresçam pensando que felicidade é ganhar o brinquedo mais caro.

[Fonte: Escrituras Sagradas ou Bíblia – Livro de LUCAS: capítulo 2, versículo 7]

sábado, 20 de dezembro de 2014

Poema e Poesia

Quando se fala em poema, logo se pensa num texto; quando se fala em poesia, logo se pensa num livro de poemas. No entanto, como diz o ditado, nem tudo é o que parece: um poema pode não ser um texto e a poesia nem sempre é um livro. “[...] há poesias sem poemas; paisagens, pessoas e fatos podem ser poéticos” (p.16), disse Octavio Paz. Sartre, em uma das passagens de A Idade da Razão, se refere ao tema: “Havia pessoas que não existiam, eram vapores, e outras que existiam demais. O barman, por exemplo. Pouco antes fumava um cigarro, vago e poético como um jasmineiro; agora acordara, era demasiado barman, sacudia o shaker, abria-o, escorria a espuma amarela nos copos, com gestos de uma precisão supérflua. Representava o papel de barman”. Em outras palavras, um cachorro passeando na rua pode ser poético, uma tarde de domingo pode ser poética, um filme na televisão pode ser poético, um jantar pode ser poético... é de um estado de espírito que estamos falando, de um fluído, e por se tratar de algo que não pode ser tocado, do mesmo modo, uma música pode não ser poética, um poema, pasmem, pode não ser poético: “um soneto [por exemplo] não é um poema mas uma forma literária, exceto quando esse mecanismo retórico – estrofes, metros e rimas – foi tocado pela poesia ” (p.16). Ou seja, uma coisa não está obrigatoriamente relacionada à outra, porém, é preciso frisar que o poema é, por excelência, "o lugar de encontro entre a poesia e homem” (p.17).
Percebendo-se disto, os idealizadores do movimento denominado “Poema-Processo”, lançaram a arte poética como algo que podia ser dissociado do texto – um poema, nesta acepção, sob a forma de um signo universal, poderia designar uma passeata ou uma performance coletiva, assim, poema (obra) e poesia (espírito) se fundiriam completamente dentro de uma coisa só.
Bukowski preferia a palavra estilo para definir a diferença entre um e outro. “Boxe pode ser uma arte/ amar pode ser uma arte/ abrir uma lata de sardinha pode ser uma arte”, dizia, “fazer algo estúpido com estilo é preferível a fazer algo perigoso sem estilo/ poucos tem estilo/ poucos tem poesia”. Octavio Paz concorda: “O poeta utiliza, adapta ou imita o fundo comum de sua época - isto é, o estilo de seu tempo -, porém, modifica [quando consegue] todos esses materiais e realiza uma obra única" (p.20-21). Conclui-se, pois, que: "O poeta se alimenta de estilos. Sem eles não haveria poemas" (p.21).

[PAZ, Octavio. O Arco e a Lira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982]

sábado, 13 de dezembro de 2014

Fórmula Poética: Ensimesmar-se

Um grande poema não precisa necessariamente de um grande poeta. Isto porque não é preciso “pertencer à vanguarda” para tanto, não é preciso conhecer todas as regras gramaticais, não é preciso conhecer as diversas correntes literárias, não é preciso ter lido muitos livros, não é preciso saber escrever muitas linhas, enfim, não é preciso muito para se fazer um grande poema. Veja:

Amores Modernos:
começo,
e-mail
e fim.
(Pedro Gabriel)

dois braços
duas pernas
dois olhos
vinte dedos
e um só cérebro

tá aí o erro.
(Gustavo Souza)

Oitenta.
Oi, tenta.
Oitenta vezes, se necessário
Mas tenta.
(Autor desconhecido)

No livro "Cartas a Um Jovem Poeta", Rainer Maria Rilke se refere à arte de fazer poesia como algo próprio do serumano, de sua alma, de seu íntimo; talvez seja esse o grande segredo: “Mesmo que se encontrasse numa prisão, cujas paredes impedissem todos os ruídos do mundo de chegar aos seus ouvidos, não lhe ficaria sempre sua infância, essa esplêndida e régia riqueza, esse tesouro de recordações? Volte a atenção para ela [...]. Se depois desta volta para dentro, deste ensimesmar-se, brotarem versos, não mais pensará em perguntar seja a quem for se são bons. Nem tão pouco tentará interessar as revistas por esses seus trabalhos, pois há de ver neles sua querida propriedade natural, um pedaço e uma voz de vida. Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter de origem está o seu critério, - o único existente” (p.23-24).

[RILKE, Rainer Maria. Cartas a um Jovem Poeta. Porto Alegre: Editora Globo, 9° ed., 1978]

sábado, 6 de dezembro de 2014

Sobre a Forma Poética

Quando se fala em poesia logo se pensa em verso e ritmo, entretanto, após os anos 1950, com o advento do Concretismo e seus desdobramentos, uma série de outros recursos – o acústico, o visual, o tipográfico, o geométrico, o simbólico etc. – foram incorporados ao modo tradicional de produção desta arte. Veja o resultado:

Este me fez lembrar de Raul Seixas “Negócio bom assim/ Ninguém nunca viu”.



Um “erro” faz parte desta composição – ou seria uma dúvida?



O dinheiro ($) caindo traz um sentido político para este poema – é como se alguém invadisse a nossa propriedade.



- Aqui há dois sentidos que se completam. Um quando se lê a palavra SOU e outro quando se lê a palavra NÓS – não somos todos um só?



- Nesta obra, a interrogação (desenhada) nos faz pensar – quem? o quê? onde? – e a verbalização nos faz sentir.



Absorvo, logo, existo?