quarta-feira, 14 de agosto de 2013

A Importância dos Beatles para Nós

Quando, de repente, nos deparamos com uma cena dos Beatles na televisão, um instante de alegria ou de curiosidade nos abre os olhos: é impossível que fluidos tão bons  passem despercebidos.
O público deles não tem idade, não tem sexo, não tem cor, não tem partido político, não tem nacionalidade, pois suas canções possuíam um sentido universal e não se restringiam à época, abordavam o homem de todos os tempos, com o objetivo de uma consciência orientada pelo amor, pelo espírito de aventura e pela compreensão do íntimo. Se havia uma orientação mercadológica, estética, comercial, midiática e/ou financeira na arte dos Beatles, esta orientação partia muito mais dos empresários, dos produtores, dos acionistas... quer dizer, de fora para dentro. Eu afirmo isto, pois, quando assisto a uma cena do quarteto, a primeira coisa que me vem à cabeça é a ideia de uma vida mais interessante ou, pra ser mais exato, de uma vida mais interessada em viver, em experimentar, em descobrir, em perceber em cada detalhe a beleza escondida.
Na minha opinião, eles foram tão importantes pra humanidade quanto Gandhi ou Martin Luther King. Se o primeiro libertou a Índia dos ingleses e ensinou as pessoas a serem simples, os Beatles popularizaram o movimento hippie e as formas alternativas de pensamento; se o segundo combateu o racismo norte-americano e provou que um homem de verdade se distingue pelo caráter e não pela cor da pele, os Beatles fizeram as pessoas se interessarem por si mesmas e pelas outras.
Quase ninguém poderia viver da maneira como viveram  Gandhi ou Martin Luther King, afinal, quase ninguém possui a capacidade de se encontrar com Deus através de uma religiosidade tão perfeita e atuante, mas muita gente poderia viver da forma como viveram os rapazes de Liverpool – rindo, fazendo brincadeiras, tocando violão, escrevendo poesia...

É fácil viver com os olhos fechados
Sem entender o que se vê.
(Magical Mystery Tour, Gravadora Apple, 1967, faixa 2:  Strawberry Fields Forever).

Se você vestir vermelho esta noite
Lembre-se do que eu lhe disse:
"vermelho é a cor que o meu amor vestia”.
(Antholoy 2, Gravadora Apple, 1996, faixa 2: Yes It Is)

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Interpretações da Sociedade

Em postagens anteriores discorri sobre a Luta de Classes, concebida por Marx e Engels, e sobre a Teoria dos Extremos, concebida pelo Papa Francisco. A título de recordação, a primeira aborda a sociedade a partir do econômico: na antiguidade, a luta entre escravos e reis; no feudalismo, a luta entre servos e senhores; atualmente a luta entre assalariados e patrões, ou seja, há, desde sempre, uma organização social cujo princípio não é a religião, a arte ou o Estado político, antes disso, é o trabalho, os frutos do trabalho, que, ironicamente, são colhidos por aqueles que não os plantaram. A segunda, a Teoria dos Extremos, possui um viés mais sociológico. Também identifica uma disputa pelas melhores condições de vida, sobretudo materiais, entretanto, não se restringe à questão trabalhista; por estar impregnada pelo ponto de vista bíblico, a Teoria do Papa Francisco reivindica “um ambiente mais humano”, enfim, uma reforma ao invés de uma revolução. 
Uma terceira linha de pensamento, inédita neste blog, lhes será apresentada agora. É a linha dostoievskiana, mais uma opção para que o leitor possa, a partir de sua escolha e visão, interpretar a sociedade: “Em resumo: se o senhor se recorda, havia lá uma certa alusão ao fato de existirem indivíduos que teriam o direito de cometer toda espécie de atos desonestos e de crimes, para os quais a lei não existiria [...]. Por exemplo: a meu ver, se um, dez ou cem homens se atravessassem no caminho de Kepler ou Newton, eles teriam o direito e até o dever... de eliminar esses dez ou esses cem homens a fim de que as suas descobertas chegassem ao conhecimento de toda humanidade. Lembro-me também de ter sugerido que todos os legisladores e fundadores da humanidade, começando pelos mais antigos e passando por Licurgo, Sólon, Maomé, Napoleão etc . etc., todos, desde o primeiro até o último, tinham sido criminosos, quando menos porque, ao promulgarem leis novas, aboliam as antigas, consideradas sagradas pela sociedade, e para isso certamente não se teriam detido diante do sangue. Também é significativo que a maior parte desses gênios da humanidade fossem uns sanguinários particularmente ferozes. No que diz respeito à distinção entre homens vulgares e extraordinários, minha ideia consistia  concretamente  em dizer que os indivíduos se dividem, segundo a lei da natureza, em duas categorias: a inferior – a dos vulgares – que unicamente é proveitosa para a procriação e a perpetuação da espécie, e a dos indivíduos que criam ou podem dizer em sua época uma palavra nova. A primeira é formada por indivíduos conservadores por natureza, disciplinados, que vivem na obediência e gostam de viver nela, e a meu ver tem a obrigação de ser obedientes, por ser esse o seu destino e não haver nisso, para eles, nada de humilhante. A segunda categoria é composta por aqueles que infringem as leis, os destrutores e os propensos a sê-lo, de acordo com suas faculdades. Os crimes destes são, naturalmente, relativos, e muito diferentes. Esses homens trabalham, por diferentes métodos, pela destruição do presente em nome de qualquer coisa de melhor no futuro. Mas se precisarem, para bem da sua ideia, saltar ainda que seja por cima de um cadáver, então eles, no seu íntimo, na sua consciência, podem, em minha opinião, conceder a si próprios a autorização para atravessar o sangue, atendendo unicamente ao seu objetivo. É só neste sentido que eu falo do seu direito ao sangue. Embora, afinal de contas, não haja nenhuma razão para se assustar. Quase nunca a massa lhes reconhece esse direito e até os castiga e os manda enforcar, cumprindo assim, com absoluta justiça, o seu destino conservador, o que não impede que, nas gerações seguintes, essa mesma massa erga os castigados sobre pedestais e se incline perante eles” (p.176-179).

[DOSTOIEVSKI, Fiódor. In: Crime e Castigo. Editora Ouro, Rio de Janeiro, 1960].

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Teoria dos Extremos

Em uma entrevista concedida à televisão brasileira, o Papa Francisco expressou o seu ponto de vista em relação à estrutura de poder que governa a sociedade mundial.
"Tudo gira em torno do dinheiro”, começou ele, “e o que não consegue penetrar neste moinho, acaba sendo arremessado pra fora”. É como se houvesse uma zona de conforto, onde residem alguns, em detrimento de outros. Os que estão de fora seriam os extremos: “gente morre de fome, gente morre de aids, gente morre em guerras, gente morre de frio, mas isto nem sempre é notícia. Em contrapartida, se a bolsa de valores cai três, quatro pontos, a mídia se alarma e os holofotes do mundo se voltam para os centros financeiros”. Seria o dinheiro mais importante do que o homem?
Nas duas pontas, excluídos do “progresso”, estariam os jovens e os idosos. “Na Europa”, exemplifica o Papa, “os índices de desemprego entre a população de até 25 anos são assombrosos. E não acaba aí. No outro extremo, os idosos estão cada vez mais abandonados. Não há uma política pública para a velhice. Enfim, o que não pertence ao centro de poder deste sistema de coisas não tem valor, é descartável. No entanto, o jovem é a revolução, o ímpeto, a utopia; o idoso é o conselho, a sabedoria, o acompanhamento. Se abandonamos os nossos filhos e avós à própria sorte, abandonamos o nosso futuro também. Pois o idoso recebe o ímpeto do jovem e o aconselha, formando o que esta no meio. Se esta formação deixa de acontecer, o que esta no meio desaparece... e a sociedade desaba”.

[Entrevista à Rede Globo de Televisão, exibida no programa Fantástico em 28/07/2013].