quinta-feira, 7 de junho de 2012

Futebol em Verso e Prosa

Joguei futebol durante dez anos, numa escolinha. E outros tantos fora dela. Hoje, mais como analista do que como peladeiro, assisto às principais partidas. Uma em especial me chamou a atenção: a que eliminou o Barcelona da Champions. Foi inacreditável. O Chelsea, algoz do time catalão, se defendeu com 11 atrás. E, pra delírio geral, venceu no contra-ataque. Os amantes do futebol ficaram decepcionados. Mas, isto não diminui nem desmerece a grandeza do melhor time de futebol dos últimos dez anos, pelo menos. Suas lições táticas se multiplicam pelos gramados afora. Não há equipe no planeta, grande ou pequena, que não imite o Barça. Inclusive nós, brasileiros. Viva o toque de bola! 

Em homenagem ao futebol-bem-jogado, eis aqui duas belas obras. Um poema e uma crônica.

Em Coríntians (2) vs. Palestra (1), Antônio Castilho de Alcântara Machado narra um pênalti. De um jogo na década de 1930. O jogador Biagio vinha com a bola, havia driblado um e se preparava para o chute, quando foi derrubado:

- CA-VA-LO!
Prrrrii!
- Pênalti!
Miquelina pôs a mão no coração. Depois fechou os olhos. Depois perguntou:
- Quem é que vai bater, Iolanda?
- O Biagio mesmo.
- Desgraçado.
O medo fez silêncio.
Prrrrii!
Pan!
- Go-o-o-ol! Coríntians!

(MACHADO, Alcântara. “Coríntians (2) vs. Palestra (1).” In: Brás, Bexiga e Barra Funda. São Paulo, O Estado de São Paulo/ Klick Editora, 1999. Páginas 52-53).

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A literalidade da crônica a seguir é comovente. Dá pra sentir a vida, a experiência do escritor enquanto escritor. A análise, o entendimento de causa. Tudo feito à mão, de um modo rústico, artesanal. Nem mais nem menos.

Pelada De Subúrbio

Nova Iguaçu, quatro horas da tarde, sábado de sol. Dois times suam a alma numa pelada barulhenta; o campo em que correm os dois times abre-se como um clarão de barro vermelho cercado por uma ponte velha, um matagal e uma chácara silenciosa, de muros altos.
A bola, das brancas, é nova e rola como um presente a encher o grande vazio de vidas tão humildes que, formalmente divididas, na verdade, juntam-se para conquistar a liberdade na abstração de uma vitória.
Um chute errado manda a bola, pelos ares, lá nos limites da chácara, de onde é devolvida, sem demora, por um arremesso misterioso. Alguns minutos mais tarde, outra vez a bola foi cair nos terrenos da chácara, de onde voltou lançada com as duas mãos por um velhinho com jeito de caseiro.
Na terceira a bola ficou por lá; ou melhor, veio, mas, cinco minutos depois, embaixo do braço de um homem gordo, cabeludo, vestido numa calça de pijama e nú da cintura pra cima. Era o dono da chácara.
A rapaziada, meio assustada, ficou na defensiva, olhando: ele entrou, foi andando para o centro do campo, pôs a bola no chão e, quando os dois times ameaçavam agradecer, com palmas e risos, o gesto do vizinho generoso, o homem tirou da cintura um revólver e disparou seis tiros na bola.
No campo, invadido pela sombra da morte, só ficou a bola, murcha.

(NOGUEIRA, Armando. Do Livro: “Os melhores da crônica brasileira”, José Olympo Editora – Rio de Janeiro, 1977, pág. 22).

11 comentários:

  1. Análise textual

    1°) Observe que, no poema "Coríntians (2) VS. Palestra (1)", Alcântara Machado se utiliza de diversos recursos estilísticos para retratar as emoções de uma partida. No momento do pênalti, por exemplo, alguém grita "CA-VA-LO!", em letras maiúsculas, separadas por hífen, como se fosse um grito. Neste caso, a visualização da obra, por parte do leitor, seria fundamental para um melhor entendimento do texto.

    2°) Ainda no poema, o uso de onomatopéias para indicar, primeiro, a marcação da penalidade (Prrrrii!!) e, depois, o chute (Pan!), também conferem um caráter original a obra.

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  2. Boa tarde, Diego.

    "um presente a encher o grande vazio de vidas tão humildes que, formalmente divididas, na verdade, juntam-se para conquistar a liberdade na abstração de uma vitória."

    O texto de Armando é mesmo delicioso de ler.

    Abçs.

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    1. Esta também foi uma das duas passagens que mais me fascinaram no texto. Porque, como o Cadú disse, no comentário de baixo, "o Armando Nogueira procura seduzir o leitor com a idéia de que o futebol unifica e confere sentido à vida".

      Uma outra passagem que me fascinou foi a introdução. "Nova Iguaçu, quatro horas da tarde, sábado de sol". Com esta descrição o escritor cria, como num passe de mágica, o cenário e atmosfera de toda uma história.

      Fiquei tentando compreender como uma crônica tão simples pode ser tão espetacular.

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  3. Fazendo a análise textual da crônica, percebe-se que, dos seus seis parágrafos, cinco são do tipo narrativo-descritivo, sendo apenas o segundo do tipo argumentativo.

    O texto argumentativo procura convencer, propondo ou impondo ao receptor uma visão particular de quem o produz. É isso que se conclui da leitura do segundo parágrafo. O escritor, Armando Nogueira, procura seduzir o leitor com a idéia de que o futebol unifica e confere sentido à vida: "A bola, das brancas, é nova e rola como um presente a encher o grande vazio de vidas tão humildes que, formalmente divididas, na verdade, juntam-se para conquistar a liberdade na abstração de uma vitória".

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  4. Bravo! Bravo! Mil vezes BRAVO! Que crônica linda cara. Incrível, realmente, como o autor consegue descrever com maestria todo um cenário que envolve uma partida (pelada) de futebol. Na verdade o homem que se dirige no centro do campo e dá seis tiros na bola é o sentimento que temos quando a bola cai no pátio vizinho, pelo menos essa é uma sensação que me é familiar quando ocorre o mesmo. Poesia integrada a um texto rico, belo e comovente, bem como tú havia citado anteriormente. Gostei de diversas passagens, mas esta em especial: "A bola, das brancas, é nova e rola como um presente a encher o grande vazio de vidas tão humildes que, formalmente divididas, na verdade, juntam-se para conquistar a liberdade na abstração de uma vitória". Realmente acho isso, no futebol a vitória é algo ilusório como um jogo de computador ou vídeo-game, que quando você desliga a máquina tudo volta a estaca zero. A VITÓRIA É ABSTRATA. Parabéns pelo seu comentário sobre o jogo que o Chelsea venceu o Barça, assisti o jogo e tive impressões semelhantes, mas confesso que torci para os Blues. Grande abraço AMIGO-IRMÃO.

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    1. De fato, vencer é relativo. Muitas vezes a derrota, dependendo do modo como se vê, pode ser uma vitória. Nas maratonas, para os competidores comuns, cruzar a linha de chegada é a verdadeira conquista, independentemente da classificação.

      Abraços, amigo-irmão.

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  5. Olá Diego, agradeço sua visita em meu Blog ,realmente postei uma obra sua no Blog, pq gostei muito,simples mas objetivo.... parabéns e mais uma vez obrigada!
    Uma ótima semana pra ti!

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    1. Visitei o blog da Nadia para comentar um poema meu que estava publicado lá.

      O blog dela se chama “Lilyth... Sonho... Mistério e Magia...”. Nele, a autora posta poemas ou belas passagens de textos; suas postagens vêm sempre acompanhadas de uma bela imagem.

      De acordo com a Wikipédia, Lilith “é um demônio feminino da mitologia Babilônica que habitava lugares desertos. Esta é referida em diversos textos antigos sendo o mais notável o Antigo Testamento”.

      Abraços, Nadia.

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  6. Opinião sobre o Campeonato Brasileiro 2012

    Análise que fiz logo após a partida entre Inter e Fluminense, válida pela quarta rodada do Brasileirão.

    Penso que Inter e Fluminense são candidatos ao título do Brasileirão. No entanto, o elenco do colorado me parece superior. Se você for analisar, o Fluminense tem apenas o Deco como meia de armação, enquanto o Inter tem o Oscar, o D’alessandro, o Dátolo e, de quebra, o Jajá. E todos os quatro tem dado boa resposta. Esse grupo qualificado será fundamental para a sequência deste longo campeonato. (O Vasco também tem bons meias). O que poderia prejudicar o Inter no momento decisivo, neste caso, seria a falta do Beira-Rio, que esta em obras. A questão, portanto, é: sem a força da torcida o colorado conseguirá ser campeão brasileiro?

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  7. O futebol é o esporte que mais atrai a atenção das pessoas aqui no Brasilo. Esse mesmo esporte pode rende milhões para um jogador profissional, muito desses jogadores vindo de periferias humildes. No Brasil existe as famosas peladas do final de semana, onde se junta um grupo de pessoas com um padrão ou não, tendo um campo ou um terreno baldio, usando tênis caros ou até descalços, mas todos com um único objetivos que é jogar futebol.

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    1. O futebol é o esporte do povo. Pode ser praticado em qualquer lugar - na areia, na quadra, no campo. Basta uma bola e gente disposta a correr atrás dela. O vôlei, por exemplo, precisa de rede e de marcação. O tênis necessita de raquete e de quadra. o Basquete, de cesta, e de bola apropriada. Pro futebol, qualquer bola serve, qualquer marcação dá, não é preciso muito, não é preciso quase nada. Por isso combina tanto com o Brasil.

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