sexta-feira, 25 de abril de 2014

Cem Anos de Solidão

Logo após a leitura dos primeiros capítulos desta obra, pensei “Gabriel García Marquez é um gênio”; li mais alguns capítulos e repensei “ele é mais do que um gênio”; li um pouco mais, e a cada vez que eu virava uma página, uma nova impressão, sempre melhor e mais fascinada, surgia “ele é um herói, ele é um imortal, ele é um revolucionário...”, enfim, eu não conseguia adjetivar o romance de Gabo, pelo simples fato de se tratar de um livro inclassificável.
Segundo a lenda, quando o diretor da editorial Sudamericana começou a ler os originais de Cem Anos de Solidão, numa noite chuvosa de abril de 1967, em Buenos Aires, foi tomado de tamanha exaltação que chamou aos gritos pelo telefone o seu companheiro literário Eloy Martínez. “Venha urgente para cá – disse – estou diante de uma obra tão extraordinária que não sei se o autor é um deus ou um louco”.
O livro, na forma, retrata a história de uma família, os Buendía, através de suas gerações, e de uma cidade, Macondo; em essência, porém, é difícil precisar sobre o que o texto fala, pois sua abordagem possui milhões de sentidos. Sergius Gonzaga, professor de Literatura Brasileira da UFRGS, se arriscou: “O final do romance é extraordinário. Precedido por ataque de formigas e por vozes que chegam do passado, o mundo anacrônico de Macondo inicia a sua decomposição sob o efeito de um terrível ciclone, enquanto o último dos Buendías, Aureliano Babilônia, começa a decifrar os personagens do cigano Melquíades, onde tudo estava antevisto: o destino da estirpe e da cidade, ambas inexoravelmente conduzidas pela fatalidade à destruição, ao fracasso existencial, cristalizado na irrevogável solidão que acompanha os seres na travessia enganosa do tempo, e à inutilidade das ações humanas diante do abismo do nada”.
O crítico literário, Flávio Loureiro Chaves, também fez sua análise. Para ele, “Gabriel García Marquez criou um mundo de múltiplas dimensões para cuja abordagem as categorias do romance tradicional são insuficientes. A história da derrocada da família Buendía é, também, a crônica da ‘cidade dos espelhos’ e esta reflete o mito da condição humana ‘acabándose a cada minuto pero sin acabar de acabarse jamás’. O panorama de um mundo em desagregação revelou a solidão insuperável da espécie humana”. Talvez seja exatamente esta a mensagem de Cem Anos de Solidão, o paradoxo existencial: acabándose a cada minuto pero sin acabar de acabarse jamás.

[Fonte: ZERO HORA (jornal). In: Caderno CULTURA. Edição de 19 de abril de 2014]

Um comentário:

  1. Sobre o Nobel recebido por García Marquez em 1982, o crítico literário Flávio Loureiro Chaves, disse:

    "Gabriela Mistral não era mais do que uma mestra-escola, fazendo poesia para comemorações cívicas. Era uma poeta menor. Neruda, sendo um poeta importante, não escapava de um neoparnasianismo muito mais ligado a formas literárias já consagradas e estagnadas. Quem joga a modernidade e expressa a modernidade da ficção latino-americana, dentro da tradição do Nobel, é García Marquez".

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