sexta-feira, 18 de abril de 2014

Atados às ideias-padrões

Somos coadjuvantes ou protagonistas da História? Existem milhares de teorias sobre esse assunto. Uma delas diz que alguns homens são mais protagonistas do que outros, é uma idéia razoável, afinal, um chefe de estado dispõe de bem mais recursos para mudar o mundo do que o Seu João ou a Dona Maria. Mas esse é apenas um dos sentidos da pergunta. O outro se refere aos elementos de persuasão de que a sociedade se utiliza para manter os sujeitos atados às ideologias de massa, às ideias-padrões.
Abrimos a revista e lá está o galã da novela das oito, com seu novo corte de cabelo e seu terno italiano, sorrindo, entre amigos, comemorando a boa-vida, bebendo uma champagne importada. Ele é um parâmetro para a sociedade; talvez não possua formação acadêmica nem ideias revolucionarias, mas e daí? ele é persuasivo, popular, e milhares de pessoas querem ser o que ele é. Até aí nada de errado, as coisas funcionam assim. O problema é que existem muitos candidatos pra poucas vagas, isto é, nem todos os homens se tornarão galãs e nem todas as mulheres se tornarão princesas. A felicidade que as revistas de fofoca estampam, não é acessível a todos, muitos terão que se contentar com uma vida bem mais modesta, bem mais simples, só que isso não vende, não dá lucro e, por isso, não é percebido pelos outros, não é valorizado pela sociedade. É como se não houvesse escolha: ou você é galã ou viverá no anonimato, como um joão-ninguém.
Eu penso que a culpa por este “reducionismo mental” seja mais da cultura das instituições, das estruturas de poder, do modo como a História está organizada do que do sujeito, pois, como eu disse ao longo do texto, somos obrigados a engolir o galã da novela, ele é o rei e pronto, é o que todo mundo diz, é o que o sistema quer que se divulgue, é nisso que o sistema quer que se acredite, é como dizia Rousseau “o homem nasce livre e a todo canto se vê sob ferros” (p.9), e quem pode ir contra? Assim, voltamos à pergunta inicial “somos coadjuvantes ou protagonistas?”. A resposta é óbvia: se alguns fazem mais a História do que outros, então caberia a essa meia-dúzia de eleitos, em tese (e somente em tese), criar um mundo onde coubessem todos os mundos.

[ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. Tradução de Rolando Roque da Silva. Edição para eBooks, 2002]

2 comentários:

  1. Em tese (e somente em tese), porque, na prática, o que se vê é uma meia-dúzia de mal-intencionados.
    Em tese (e somente em tese), porque, na prática, o que se vê é luta de classes.
    Em tese (e somente em tese), porque, na prática, o super-herói é um personagem da ficção.
    Em tese (e somente em tese), porque, na prática, é cada um por si.

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  2. Esperar que esta meia-dúzia - e aí se incluem políticos corruptos, diretores de empresas privadas, bancários, socialites - faça alguma coisa pela maioria, é a mesma coisa que esperar que Deus desça dos céus e acabe com as desgraças - essa meia-dúzia só encherga os outros quando percebe vantagem pessoal. Como dizia Rousseau "Enquanto um povo é constrangido a obedecer e obedece, faz bem; tão logo ele possa sacudir o jugo e o sacode, faz ainda melhor".

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