Em uma das passagens do livro Sociedade Midíocre, Juremir
Machado da Silva diz: “Nas sociedades hipermodernas sem guerras, com
expectativa média de vida ascendente e com jornadas de trabalho declinantes, o
tempo livre tornou-se o grande problema. O que fazer dele? Pensou-se em fazer
de todos os homens poetas, artistas e intelectuais. Mais uma utopia fracassada”.
Nos tornamos consumidores; artistas pintam quadros, poetas leem livros,
intelectuais promovem revoluções, nós não fazemos nada disso; nós andamos de
carro. Como num filme que vi, intitulado American Graffiti, de 1973, onde
quem possuísse a máquina mais potente era visto como o maioral, onde quem
possuísse a máquina mais potente acabava transando com a mulher mais gostosa; numa
cena reveladora, um idiota, que pegara o carrão do amigo para dar uma rolé,
intima a mais cobiçada das garotas da cidade, ela se aproxima e, sem se
importar com o sujeito, começa a analisar o carango, dizendo coisas do tipo
“deve ser muito potente”, “adoro arrancar cantando rodas”; em resumo,
trocava-se o serumano pelo objeto – um prenúncio do que hoje é absolutamente
normal. Como agentes deste processo -completa Juremir - o carro e a televisão
“tem agora a cumplicidade do computador, dos games, dos celulares, dos tabletes
e de muitos gadgets sacralizados pelo poder de aliviar as pessoas do vazio
humano cada vez mais evidente e produtor de doenças”. É como se o mundo
houvesse se tornado um quadro de Edward Hopper:
O atentado contra o avião da Germanwings é a prova mais
recente disto. Um homem, aparentemente normal, acima de qualquer suspeita,
filho de um gerente de banco e de uma professora de piano, morador de um bairro
de classe média alta, tido como uma pessoa boa pelos vizinhos, de repente, não
mais do que de repente, mata 150 pessoas com uma cajadada só. Sua ex-namorada,
em relato à polícia, disse que se separara de Andreas pois ele se comportava de
uma maneira estranha, disse que ele era depressivo, que precisava de muito
carinho na vida privada e que prometera a ela que um dia se tornaria conhecido
no mundo todo. Pasmem, ó leitores, Andreas Lubitz protagonizou uma chacina em
nome daqueles tão sonhados 15 minutos de fama. Abaixo a sociedade do
espetáculo!
"As Artes Marciais Mistas (MMA/UFC) disciplinam a violência, o futebol continua a funcionar como guerra simbólica entre as nações, a música de consumo fácil dá leveza à existência, os reality shows sepultam o peso da dramatização excessiva, complicada, pretensiosa e arrogante, as telenovelas embalam os dias úteis tornados inúteis pelo tédio. A máxima deste novo mundo, dividido entre celebridades e anônimos, ídolos e fãs, visíveis e invisíveis, esse universo mediado por telas, é cinicamente trivial: se funciona, qual o problema?" (Juremir Machado da Silva).
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