quarta-feira, 12 de junho de 2013

Amor ao Destino

Muitas pessoas não são felizes. Isto parece uma 
afirmação óbvia, entretanto, não é. Muitas destas muitas pessoas deveriam ser felizes, têm condições para isso, mas não são. O óbvio, neste caso, seria: por quê?

O caminho que a vida da gente toma às vezes é tão dolorido... acho que é por isso que as pessoas de idade gostam de guardar coisas velhas. Parafusos, roupas usadas, lembrancinhas, quinquilharias que, pelo valor sentimental ou por qualquer outra desculpa, ficam ali, guardadas na gaveta, esperando o dia em que lhes será dado um destino. Mas este dia nunca chega...
Os meses passam, os anos passam, a vida passa e aqueles objetos permanecem guardados, como se o tempo não fizesse sentido. Na verdade, é dentro da gente que estas coisas estão. Acredite. Você já pensou milhares de vezes em rasgar aquelas fotos, em se desfazer dos enfeites, em doar as louças, em se livrar do excesso e não o fez. Indo mais fundo, você já pensou (e ainda pensa) em mudar de hábitos, de pensamentos, de sonhos, de casa, de cidade, de emprego, de amigo, de namorada, mas você não consegue, você vive a mesma vida sempre! Na verdade, é dentro de você que as coisas estão trancadas. As coisas velhas na gaveta apenas indicam isto; só isto.

Estava lendo um artigo que falava justamente sobre este assunto. É como se tivéssemos medo do nosso próprio destino, de viver a nossa própria vida, de ser a nossa própria contradição. Quando um sentimento é bom, o queremos pra sempre; quando é ruim, desejamos que se vá. Agindo assim, deixamos de perceber a finitude de todas as coisas – o resultado é o medo de rasgar uma foto antiga, é o aprisionamento ao passado, é viver sem estar vivo, é um presente insosso, é um destino que não se resolve, é a falta de amor por si mesmo.
O artigo, intitulado "Dois poemas à luz do pensamento de Nietzsche", explica isto: "a vida se depara com o irremediável, não há outra saída senão viver sem fuga, sem covardia, sem subterfúgios, o bem e o mal, a degradação, o medo, a morte, o belo e o nascimento, porque tudo é precioso. Enfim, é deste jeito que é: uma parte de mim sofre, outra pede amor, outra viaja, outra discute, uma última trabalha, sou todas as comunicações, como posso ser triste?” (p.95-96, com adaptações).

[MACEDO, Iracema. In: Dois poemas de Drummond à luz do pensamento de Nietzsche. IpotesLi, revista de literários, Juiz de Fora, v.7, n.1, p.93 a 98].

Um comentário:

  1. Drummond combinando com Nietzsche, o pensamento não possui fronteiras. Filosofia é poema e vice-versa:

    Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
    Teu ombros suportam o mundo
    e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
    As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
    provam apenas que a vida prossegue
    e nem todos se libertaram ainda.
    Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
    prefeririam (os delicados) morrer.
    Chegou um tempo em que não adianta morrer.
    Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
    A vida apenas, sem mistificação.
    (Drummond)



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