quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Por detrás dos panos

O poema O Açúcar, escrito por Ferreira Gullar, nos diz o que há por detrás dos panos: “O branco açúcar que adoçará meu café/ nesta manhã de Ipanema/ não foi produzido por mim/ nem surgiu dentro do açucareiro por milagre./ Vejo-o puro/ e afável ao paladar/ como beijo de moça, água/ na pele, flor/ que se dissolve na boca. Mas este açúcar/ não foi feito por mim./ Este açúcar veio/ de uma usina de açúcar em Pernambuco/ ou no Estado do Rio/ e tampouco o fez o dono da usina./ Este açúcar era cana/ e veio dos canaviais extensos/ que não nascem por acaso/ no regaço do vale (...)/ Em usinas escuras,/ homens de vida amarga/ e dura/ produziram este açúcar/ branco e puro/ com que adoço meu café nesta manhã de Ipanema”.
A oposição entre o branco do açúcar e o esforço de homens de vida amarga, caracteriza o processo de produção que se inicia nos canaviais, passa pela usina, pela mercearia do Oliveira, e termina no açucareiro, depois que o produto final é comercializado e consumido. Uma situação que se estende ao conjunto da sociedade. Por detrás da bela carta de amor que o apaixonado lê, esconde-se o trabalho incansável do carteiro; por detrás da bela pizza que o garçom joga sobre a mesa, esta o penoso trabalho do auxiliar de cozinha; por detrás dos belos edifícios do centro da cidade, oculta-se o árduo trabalho do servente: o capitalismo edifica-se às custas do operariado (p.8-9).

Mas quem vê o belo pacote de açúcar nas prateleiras do comércio, não percebe isto, e se ilude - um mundo doce.

[ARAÚJO, Diego. Formação do Mercado Mundial e Aburguesamento. Unesc (trabalho de conclusão de curso), SC, 2010, 54 páginas]

3 comentários:

  1. "Sua mercadoria barata constitui sua arma mais poderosa, capaz de destruir até as muralhas da China e de submeter os bárbaros mais arredios ao domínio estrangeiro. Com mão férrea, obriga todas as nações a adotarem um modo burguês de produção, sob pena de desaparecerem se não o aceitarem; força-as a optarem pela chamada civilização ou, em outras palavras, a se aburguesarem" (Marx e Engels).

    ResponderExcluir
  2. É o chamado fetiche da mercadoria: consiste numa ilusão que naturaliza um ambiente social específico, revelando sua aparência de igualdade e ocultando sua essência de desigualdade.

    ResponderExcluir
  3. Dando continuidade ao raciocínio.

    Na teoria marxista, o fetichismo é o processo pelo qual a mercadoria, no capitalismo, um ser inanimado, passa a ser considerado como se tivesse vida. As pessoas desenvolvem sentimentos afetivos por carros, pelo Facebook, enfim, pelo material. Com isso ocorre a desumanização do ser humano no capitalismo, com a ilusão de que não há relações humanas (isto é, sociais) no que se refere à mercadoria.

    Um mundo salgado!

    ResponderExcluir