A
muitos anos atrás – sete ou oito – encontrei, num sebo, enfiado no final de uma
prateleira, um livro que, de cara, me pareceu interessante. Tratava-se de
“Cartas a um Jovem Poeta”, de Rainer Maria Rilke; eu sequer conhecia o autor,
mas, depois de umas folheadas, resolvi comprar a obra. A leitura, porém, eu a consumei
somente esta semana.
As
cartas, que são dez, narram os conselhos que Kappus – um jovem que sonhava em
se tornar poeta – recebeu de Rilke. Mas estes conselhos não são de ordem técnica ou
crítica, antes disso, “[...] tratam da formação humana, base de toda criação
artística”, como bem resumiu Cecília Meireles, no prefácio. Ao invés de falar
sobre como se deve escrever um texto, Rainer propõe reflexões do tipo
“Já se modificaram muitas noções relativas ao movimento; há de se reconhecer,
aos poucos, que aquilo a que chamamos destino sai de dentro dos homens em vez
de entrar neles” (p.64). São palavras de sabedoria que procuram tocar o íntimo.
“Até o comer, os homens transformaram em algo diferente: a carência de um lado,
o excesso de outro perturbaram a clareza desta necessidade; e todas as
necessidades elementares em que a vida se renova tornaram-se igualmente turvas.
O indivíduo, porém, pode esclarecê-las para si mesmo e vivê-las às claras (não
todos os indivíduos demasiado dependentes, mas pelo menos os solitários).
Sobre
a arte de escrever, propriamente dita, Rilke apenas alertava: “Deixe-me
fazer-lhe aqui um pedido: leia o menos possível trabalhos de estética e
crítica. Ou são opiniões partidárias petrificadas e tornadas sem sentido em sua
rispidez morta, ou hábeis jogos de palavras inspirados hoje numa opinião,
amanhã noutra” (p.31-32). O poeta tcheco sabia que tanto a literatura quanto a
arte vinham de dentro e não de fora. Prova disto é a escritora brasileira
Carolina de Jesus – negra, semianalfabeta e pobre, ela foi a primeira autora a
contar como era a favela sob o ponto de vista de quem viva lá. E acabou virando
best-seller, sendo traduzida para 13 línguas.
A fórmula do sucesso é o nosso próprio mistério: “Por que deseja excluir de sua
vida toda e qualquer inquietação, dor e melancolia, quando não sabe como tais
circunstâncias trabalham no seu aperfeiçoamento? Para que perseguir-se a si
mesmo com a pergunta: de onde pode vir tudo aquilo e para onde vai? Não sabia
estar em transição? Desejava algo melhor do que transformar-se?” (p.68).
[RILKE,
Rainer Maria. Cartas a um Jovem Poeta. Porto Alegre: Editora Globo, 1978, 9°
ed.]
“Pergunta se os seus versos são bons. Pergunta-o a mim, depois de o ter perguntado a outras pessoas. Manda-os a periódicos, compara-os com outras poesias e inquieta-se quando suas tentativas são recusadas por um ou outro redator. Pois bem – usando da licença que me deu de aconselhá-lo – peço-lhe que deixe tudo isso. O senhor está olhando para fora, e é justamente o que menos deveria fazer neste momento. Ninguém o pode aconselhar ou ajudar, - ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo” (p.22).
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