Assisti a um documentário magnífico intitulado Sobre como
a Arte fez o Mundo I onde se conjecturava sobre a possibilidade de a imaginação
humana ter sido o nosso grande diferencial em relação as outras espécies.
Numa expedição arqueológica ao nordeste da Áustria,
descobriu-se a primeira imagem esculpida que o homem teria feito de si mesmo, a
chamada Vênus de Willendorf; a peça, apesar de intacta, não possuía os braços
nem as feições do rosto, por outro lado, possuía os seios e o ventre grandes;
tratava-se de uma mulher – constataram os estudiosos – mas o porquê d’ela ter
sido feita daquela “maneira irreal” não se sabia. Em outras localidades descobriram-se
estátuas semelhantes, mas, a 25 mil anos atrás, uma localidade não tinha
contato com a outra; então por que as peças se pareciam? A resposta tem a ver
com as características da época. Como houve uma mudança brusca no clima, as
famílias, que eram nômades, começaram a sofrer com a falta de alimentos, com
isso as possibilidades de perpetuação da espécie tornaram-se escassas e o homem,
numa tentativa de se reinventar, imaginou-se fértil, como se fosse uma mulher
grávida.
O documentário segue com a sua busca, investiga a
civilização egípcia, a civilização grega e observa que também aí os artistas tenderam
a distorcer a forma humana, tenderam a subverter a realidade.
Logo me recorreu uma passagem de Mário Quintana: “Desde
pequeno, tive tendência para personificar as coisas. Tia Tula, que achava que
mormaço fazia mal, sempre gritava: Vem pra dentro, menino, olha o mormaço! Mas eu ouvia o mormaço com M maiúsculo. Mormaço, para mim, era um velho que
pegava crianças! Ia lá pra dentro logo. E ainda hoje, quando leio que alguém se
viu perseguido pelo clamor público, vejo com estes olhos o Sr. Clamor Público,
magro, arquejante, de preto, brandindo um guarda-chuva, com gogó protuberante
que se abaixa e levanta no excitamento da perseguição” (p.204).
[QUINTANA, Mário. Coisas & Pessoas. In: DOS SANTOS,
Joaquim Ferreira (org.). As Cem Melhores Crônicas Brasileiras. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2007]
“Não desças os degraus do sonho
ResponderExcluirPara não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos – onde –
Os Deuses, por trás de suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas: fica.
O mistério está é na tua vida!"
(Mário Quintana).